No 173 - Ano XIV - Junho de 2010


"El Gancho" - por Liliana Rago (ARG)

O tango é mesmo uma  abstração de dança e música, e o par que está dançando com o fervor de um transe religioso, não se olha, não troca duas palavras, nesse ritual de con-fissão ritmado.

Eles são acionados pela música como o vento fustiga a natureza provocando mudanças transitórias, porque no fim as formas se reintegram nas atávicas linhas perduráveis: Luiz e Maria, amigos, namo-rados, ou parceiros apenas de uma noite.

Essa simbiose explica um intrigante momento da história dessa dança: a ronda noturnal daqueles homens e seus cravos de sangue latejando, chambergos que mudavam de postura com um gesto veloz das longas mãos, toda vez eu um requebro era inventado.

O tango ainda “malevo” não feria a masculinidade dos raçudos rapazes que dançavam nas esquinas, à luz do alto poste, das estrelas que ponteavam o ritmo titilando, do sorriso amarelo do boteco, e ao vi-brante compasso das seis cordas e das palavras mudas que chorava o louco bandoneón enluarado.

Toca tangó!  Saltoneando, taconeando, tangoneando, gardeleando!

Carlos Hugo Christensen – cineasta argentino

 

Cantemos

(Tango)

Música: Anselmo Aieta                                                                                                                             Letra: Francisco G. Jiménez

Un bandoneón, con su resuello tristón.

La noche en el cristal de la copa y del bar, y del tiempo que pasó...

Mi corazón, con su borracha emoción.

Y en otra voz, la voz de la historia vulgar, dice mi vulgar dolor...

 

Mariposita, muchachita de mi barrio,

te busco por el centro, te busco y no te encuentro,

siguiendo este calvario con la cruz del mismo error.

Te busco porque acaso nos iríamos del brazo...

Vos te equivocaste con tu arrullo de sedas palpitantes,

y yo con mi barullo de sueños delirantes, en un mundo engañador.

¡Volvamos a lo de antes! ¡Dame el brazo y vámonos!

 

Ni vos ni yo sabemos cuál se perdió.

Ni dónde el bien, ni el mal, tuvo un día final y otro día comenzó...

Yo bebo más porque esta noche vendrás.

Mi corazón te ve; pero habrá de beber mucho, pero mucho más!...

Orquestra de Alberto Marino, dirigida pelo maestro Osvaldo Manzi, canta Alberto Marino.

 

Assim se tece a história

 

Dizia-se que era um luxo para o tango.  Esse exagero obedecia, com certeza, a seu registro de tenor e à influência da escola italiana de canto, que embora tenha influenciado vários vocalistas do tango, no caso de Marino dava a sensação de que sobrava voz para o desafio que as letras lhe apresentavam.  Passava de um potente agudo a um profundo baixo com a facilidade dos eleitos, possuía um vibrato inconfundível, porém do qual não abusava.  O certo é que o grande maestro Alfredo Gobbi o batizou como "A voz de ouro do tango".

Nasceu em 26 de abril de 1923 e seu nome real era Vicente Marinaro.  Debutou como cantor na orquestra de Emilio Balcarce em 1939 usando o apelido de Alberto Demari.  Quando Emilio Orlando assumiu a direção dessa orquestra, o cantor mudou seu nome artístico, que permaneceria em toda a sua carreira, Alberto Marino.

O bandoneonista Anibal Troilo o ouviu cantar e convidou-o a integrar seu grupo, junto a quem trabalhou de 1943 a 1947.  Para muitos foi a melhor época do cantor, suas versões dos tangos Tres amigos, Fuimos e Tal vez será su voz são verdadeiras jóias, entre muitas outras, de sua colaboração à história do tango. 

Logo após essa etapa de sucesso, decidiu começar sua carreira como solista.  Emilio Balcarce, novamente, foi o condutor de sua primeira orquestra.  Depois, assume a batuta o bandoneonista Enrique Alessio e o uruguaio Héctor Artola.  Nesse período destacam-se as gravações dos tangos El motivo, Farolito de papel e Venganza, um samba brasileiro de Lupicínio Rodrigues arranjado em tempo de tango.

Pelo final de 1949 passa a acompanhar-se pelo conjunto de violões de Roberto Grela.  Na década de 50, continua sua intensa atividade junto a numerosas orquestras como as de Hugo Baralis, Osvaldo Manzi, Alfredo De Franco.  Também nessa década realiza várias turnês pela América Latina e Estados Unidos.  Nos anos 60 é acompanhado pelos violões de José Canet. No final dos anos 60 e durante os 70 continuou atuando ininterruptamente junto a orquestras de alto nível como as de Miguel Caló, Armando Pontier, Carlos García, Osvaldo Requena, Alberto Di Paulo, deixando diversas gravações. 

Já não tinha mais o registro de tenor, mas continuou brilhando como um exímio barítono.  Alberto Marino se foi de repente, em 21 de junho de 1989, deixando uma lembrança indelével em todos admiradores do brilho e da sonoridade de sua voz de ouro.

Fonte:  Ricardo Garcia Blaya para Todo Tango – trad. RM