No 92 - Ano VIII - Agosto de 2003


Susana Delgado - clique para visitar seu site

 

Romance que começa no olhar, continua no abraço e se desenvolve na dança.  Contratempo de vivência e criatividade, equilíbrio com sensibilidade, cumplicidade com arisca sedução.  A partir do abraço pactua-se silenciosamente a qualidade da entrega.  Não se olham nem se falam.  Se as palavras fazem falta é porque a linguagem corporal está falhando.  Ela não toma a iniciativa, apenas insere algum enfeite que não perturbe a continuidade do movimento.  Pressente a intenção e apenas se retarda, para criar suspense e uma leve tensão que indica que ela está ali, que ele não está dançando sozinho.

No tango, como na vida, o único domínio do tempo que a mulher tem com relação ao homem é contê-lo, nunca apressá-lo.  O homem avança e a mulher resiste, claro, sem muita convicção.  Milongueiro de lei nem precisa conduzir muito.  Toma-a firmemente entre seus braços e a estreita contra seu peito.  Leva-a encaixada, “dormida”, e a conduz com o fole ritmado de sua própria respiração.  Parecem um só, corpo e alma.  Mas dizem que para dançar o tango é necessário haver dois.  Apesar disso, dois não bastam. 

Nessa celebração, homem e mulher estão dançando acompanhados: dançam com a música, lenta, suave, ou rápida e picadinha.  Com cada orquestra e seu estilo único, seguindo o ritmo ou a melodia, o bandoneón ou o violino.  Com o cantor, que lhes sussurra fragmentos de sonhos ou pesadelos. Dança cada um consigo mesmo, seu sentimento, seu corpo, seu ouvido que transforma a música em movimento.  Dançam com os outros casais em círculo, formando um grande coral que multiplica sua própria energia. 

Emudece a última nota, o abraço dura alguns momentos mais.  Quando a experiência é assim fora do comum, as palavras sobram. Olham-se quase que envergonhados, ou nem se olham, comovidos e assustados com tanta entrega.

(Fonte: Internet – trad. RM)

 

Cantemos

 (Tango – 1932)

 Música:   Azucena Maizani e Orestre Cúfaro                                                  Letra:   Manuel Romero

Buenos Aires, cuando lejos me vi

sólo hallaba consuelo

en las notas de un tango dulzón

que lloraba el bandoneón.

Buenos Aires, suspirando por ti

bajo el sol de otro cielo,

cuánto lloró mi corazón

escuchando tu nostálgica canción.

Canción maleva, canción de Buenos Aires,

hay algo en tus entrañas que vive y que perdura.

Canción maleva, lamento de amargura,

sonrisa de esperanza, sollozo de pasión.

Ese es el tango canción de Buenos Aires,

nacido en el suburbio que hoy reina en todo el mundo.

Este es el tango que llevo muy profundo

clavado en lo más hondo del criollo corazón.

Buenos Aires donde el tango nació,

tierra mía querida.

Yo quisiera poderte ofrendar

todo el alma en mi cantar

y le pido a mi destino el favor

de que al fin de mi vida

oiga el llorar del bandoneón

entonando tu nostálgica canción.

 

Assim se tece a história

 

Chamavam-no "El Gallego", mas sua obra, na sua totalidade, foi um monumento portenho. Manuel Romero nasceu em Buenos Aires, no dia da primavera de 1891, quando o tango era uma apagada musiquinha de subúrbio.  Foi jornalista no Fray Mocho, Critica e Ultima Hora e amigo fraterno de Pascual Contursi.  Seus primeiros passos no teatro foram dados com "Percanta que me amuraste", adaptação despretensiosa de "Mi noche triste".  O tango seria parte de seu destino.

Em 1931, com 40 anos, protagoniza como autor e produtor uma turnê européia que tornou-se histórica. Acompanharam-no Gloria Guzmán, Bayón Herrera, Pedro Quartucci e Sofia Bozán.  Em Paris, nos estúdios da Paramount, dirige o filme "Luces de Buenos Aires", com a participação de Carlos Gardel.  Sem dúvida, junto a José Ferreyra e Leopoldo Torre Rios, Manuel Romero foi referência do cinema popular portenho: entre 1937 e 1940 filma "Los muchachos de antes no usaban gomina", "Tres anclados en París", "Carnaval de antaño" e "La vida es un tango".  Filmes atraentes, com estampa portenha, que requeriam letras de tango, algumas das quais ultrapassaram largamente o invólucro para o qual haviam sido criadas.  Autor central daquele momento especial da vida argentina, sua obra se justificaria apenas com a menção de três achados:  "Tiempos viejos", "Las vueltas de la vida" e - sobretudo - "Aquel tapado de armiño", obra na qual dirige uma visão inovadora sobre o tema do rompimento de um casal, incorporando algum dos seus fetiches (o arminho), para contar com poucas palavras os descompassos de uma relação em decadência, para permitir-se o uso da ironia exercitada em si mesmo.

La canción de Buenos Aires, "Haragán", "Buenos Aires" e "El vino triste" constituem outras expressões notáveis desse autor que escreveu com paixão, mas sem violência; exaltado, mas compreensivo da fraqueza humana de seus personagens.  Esse olhar às vezes ingênuo, outras terno, permitiu a Romero imagens expressivas associadas aos sub-temas do gênero: "Que el vino se vuelva/ pesado y tristón/como el triste aletear/de esta canción.  Morreu em 1954, em retirada como no último tango.

Fonte:  Todo Tango/Portal del Tango – trad. RM